terça-feira, 12 de novembro de 2013

Vale vende sua participação na norueguesa Hydro: desnacionalização total da cadeia de alumínio

Hoje li num site de business que a Vale vendeu sua participação de 22% na norueguesa Hydro, por US$ 1,8 bilhão. A Hydro assumira em 2011 a cadeia completa de produção de alumínio, desde a mina de bauxita de Paragominas até o complexo industrial Albras-Alunorte em Barcarena, Pará.
 Vale SA Chief Executive Officer Murilo Ferreira
 CEO da Vale, Murilo Ferreira, está orgulhoso de se desfazer do mico do alumínio e jogar toda a riqueza mineral do Brasil nas mãos dos noruegueses.

A transação envolvia pagamento não apenas em dinheiro, mas também em participação acionária transferida da Hydro à Vale (22% das ações mais uma cadeira no board da norueguesa). Agora, a Vale, orgulhosamente, se desfaz do último elo que ligava todo esse complexo mineral ao Brasil, completando o ciclo de desnacionalização do aluminio produzido na Amazônia. A justificativa da mineradora brasileira é a de enxugamento, venda de ativos para se concentrar em seu carro-chefe, a produção de minério de ferro em Carajás.
Lembrei-me de um artigo do festejado jornalista paraense Lucio Flavio Pinto, em que ele critica a Vale como uma multinacional "anti-Brasil". E se refere justamente à operação de venda da sua cadeia de alumínio à norueguesa Hydro, que à época festejara a maior operação de aquisição de ativos da história da Noruega, garantindo um suprimento de matéria-prima para o mercado norueguês pelos próximos 100 anos. Uma empresa que foi concebida como de interesse estratégico nacional, depois de privatizada, simplesmente se desfaz de reservas importantíssimas de minério que poderiam, se bem administradas, ensejar um ciclo de desenvolvimento positivo em uma grande região.E ainda por cima espiona jornalistas e ativistas de movimentos sociais e organizações da sociedade civil que ousam denunciar seus descalabros.


Ao mesmo tempo, tramita no Congresso uma proposta de reforma do Código de Mineração. O projeto de lei apresentado pelo governo pretende dar mais celeridade e segurança jurídica para sustentar o boom de mineração que o país vem vivendo na última década. Por outro lado, silencia em aspectos importantes como os impactos socioambientais da atividade. Um comitê da sociedade civil com centenas de organizações, contrário à forma como o novo marco legal vem sendo discutido, lançou ontem um video interessante sobre os impactos dessa atividade, e a necessidade de abrir um debate mais amplo sobre o interesse nacional sobre as reservas de minério e as salvaguardas socioambientais para essa atividade.
E o Brasil, como fica nisso? Com que pedaço dessa história ficam os paraenses? Apenas com a contaminação, como em Barcarena? E qual a responsabilidade socioambiental dos noruegueses sobre todo esse complexo? Um ou dois projetinhos locais para treinar mão de obra qualificada e embelezar Paragominas? Construir um estádio de futebol onde não há time?
É realmente incrível a burrice de nossos governantes, e a apatia de todos nós.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Governo ultradireita corta recursos da cooperação internacional


Na última 6a feira (8/11/13), o recém eleito governo norueguês, formado por uma coalizão direita-ultradireita, lançou sua proposta de orçamento público para o ano que vem. O documento indica mudanças no orçamento já proposto pelo governo de saída, formado pela coalizão social democrata. No campo da cooperação internacional, conforme já se esperava, as notícias não são boas.




A dupla reaça-dinâmica Erna Solberg (primeira ministra) e Siv Jensen (ministra de finanças) apresentou o orçamento do novo governo para 2014 no parlamento norueguês; cortes para cooperação internacional, facilidades para o empresariado norueguês ganhar o mundo.

Clima&Florestas sofre corte

Há uns 10 dias atrás, numa conferência sobre REDD+ organizada pela Norad, a nova ministra do meio ambiente Tine Sundtoft (Høyre) declarou:
"reduzir o desmatamento é uma das poucas possibilidades absolutamente necessárias para redução de emissões rápido o suficiente para limitar o aquecimento global a até 2 graus. É portanto absolutamente necessário reduzir drasticamente o desmatamento em países tropicais. Não no futuro, mas no curso dos dois próximos anos."
Era um sinal de esperança, que se esfumaçou poucos dias depois. Na 6a passada, o governo resolveu cortar 400 milhões de coroas (R$ 150 milhões) da política de Clima&Florestas, sob a qual se situa o apoio ao Fundo Amazônia via BNDES.
Isso não necessariamente significa que o corte recairá diretamente sobre o Brasil, já que a política se aplica também a outros países com florestas tropicais sob pressão de desmatamento, como Congo e Indonésia.
A justificativa para o corte é o surrado argumento de que a grana está parada na conta. Esse discurso vem sendo exaustivamente repetido por diferentes meios de comunicação e políticos noruegueses há muito tempo. A despeito das tentativas de mostrar que a cautela no uso dos recursos é algo positivo, que criar mecanismos de controle social toma tempo, mas depois evita o mau uso e desvio de grana, o conto foi repetido tantas vezes que virou verdade absoluta, ainda mais quando apela para o bolso do contribuinte norueguês.



A nova ministra do meio ambiente fala bem do REDD+ em conferência temática em Oslo; dias depois, tesourou o orçamento destinado à iniciativa.


A crítica veio tomar vernizes oficiais a partir de um parecer do tribunal de contas norueguês (Riksrevisjon) apontando falhas na gestão dos recursos da política de Clima&Florestas, como p.ex. a falta de indicadores para alcance de resultados e dos objetivos.
O calcanhar de aquiles da política tem sido a Indonésia, onde problemas de corrupção afetam a implementação de qualquer coisa. No Brasil, para o tribunal norueguês, o fato da grana ficar no BNDES, ao invés de vantagem, é mico: afirmam que não é possível verificar com exatidão como o recurso está sendo usado, nem quanto há em desuso, pois o banco joga a grana na conta geral e não discrimina o suficiente. A falta de transparência do banco e sua inexperiência/incapacidade de lidar com projetos em pequena escala contribui diretamente para o quadro de corte.
Arrimado nesse parecer, foi fácil ao novo governo justificar a tesourada; mas ao mesmo tempo, prometem que, se a demanda por recursos aumentar, eles virão (desde que haja resultados concretos). Assim afirmou o governo em sua página oficial: "os países receptores têm mostrado que necessitam de tempo para desenvolver projetos concretos de cooperação. Isso indica que a proposta de alocação pode ser reduzida sem que isso signifique redução de atividades. O governo reduz portanto a proposta de alocação para 2014 em 400 milhões, para 2.512,5 milhões de coroas. Caso a necessidade de recursos para pagamentos baseados em resultados para 2014 for maior, o governo proporá a alocação de recursos em consonância com o compromisso climático".


América Latina tem corte; Banco Mundial e Norfund aprofundam modelito cooperação-business

O novo orçamento dos conservadores mostra que o governo pretende adotar uma vertente nórdica do lulismo: investir nos mais pobres e nos mais ricos.
O governo cortou recursos da cooperação bilateral com países da América Latina, e aumentou para os países mais pobres da África, sob a modalidade de "desenvolvimento de negócios", ou seja, para estimular a criação, instalação e promoção de novas empresas, de preferência norueguesas, nesses locais.
Esse modelito cooperação-business fica ainda mais evidente no aumento de recursos para o Banco Mundial (260 milhões de coroas, R$ 97,7 milhões), em especial para a Associação Internacional de Fomento, o braço do banco nos países mais pobres. O foco temático que o governo norueguês pretende imprimir é investir na educação de meninas.
O fundo norueguês de investimentos em países em desenvolvimento - Norfund também teve sua carteira abonada com o novo orçamento (50 milhões de coroas, R$ 18,8 milhões). O fundo investe em facilitar a vida de empresas norueguesas atuando fora de seu país de origem. Trata-se portanto de promover o empresariado norueguês mundo afora.

Mais por vir... 

O governo anunciou cortes tímidos, com a cautela de quem entra em terreno novo, sem maioria no parlamento. Resta saber como a dupla dinâmica Solberg/Jensen vai soltar suas asinhas no decorrer dos tenebrosos 4 anos de mandato...